Dia da Imprensa. Diante de tantas mudanças no setor, há o que comemorar?

Danilo Vivan, sócio-diretor da Agência Fato Relevante

Publicado em 01 de JUNHO de 2022


Sim e não.
Comecemos com uma curiosidade: você sabe como surgiu a efeméride? O Dia da
Imprensa (sim, com letra maiúscula, ou “caixa alta”) é uma referência ao lançamento, em 1808, do Correio Braziliense, fundado por Hipólito da Costa e que fazia críticas ao governo de D. João, sendo por isso mesmo editado em Londres, com circulação clandestina em terras brasileiras. O jornal, aliás, não é o mesmo que
sua versão homônima ainda em atividade no Distrito Federal. Mas esse último recebeu, sim, o nome como uma homenagem de Assis Chateaubriand ao Correio original, aquele do século XIX.

De volta ao presente. Quem é do ramo tem acompanhado a queda de circulação dos grandes veículos em suas versões impressas, movimento que já vinha ocorrendo antes da pandemia e que, a partir dela, se acentuou bastante. Dados do IVC (Instituto Verificador de Circulação) mostram que, na média, a circulação dos 10
maiores jornais do País caiu 12,8% no ano passado em comparação com 2020. Um histórico baixo interesse da população pela leitura em geral e fatores conjunturais, como a praticidade do meio digital e uma aversão, no auge da pandemia, ao contato físico com os jornais impressos, são algumas das prováveis causas desse movimento.

A migração para assinaturas e anúncios digitais talvez pudesse contrabalançar a queda na circulação do impresso, mas isso está longe de ocorrer. Há, sim, um aumento nas assinaturas pagas — e, como mostraremos a seguir, alguns veículos têm se beneficiado disso. Mas dois fatores pesam contra. Em primeiro lugar, em um
mundo de “freemiuns” e modelos de negócios baseados em serviços gratuitos, o público se desacostumou a pagar por conteúdo. E informação bem apurada, texto bem escrito, profissionais bem formados e experientes… tudo isso custa caro. Segundo fator: o número de assinaturas digitais aumentou 5,8% em 2020, período em que, como acabo de mencionar, a circulação dos impressos diminuiu, em média, 12,8%. A conta não fecha.

Mas olhemos o lado cheio do copo. De uns anos para cá, profissionais egressos de algumas das principais redações do país têm investido em publicações próprias e focadas em temas como finanças, ESG, Direito, startups, blockchain e outros. Com estruturas mais enxutas que as dos jornalões e equipes experientes, têm produzido coberturas ágeis e aprofundadas. Muitos deles já são referência em suas áreas. É o futuro do jornalismo? Difícil dizer. Mas é um movimento promissor.

Do lado da chamada “grande imprensa”, há também motivo para esperança. O turbilhão de informações falsas produzido pela pandemia gerou um aumento da confiança na informação produzida pela mídia. Pesquisa do Instituto Reuters e da Universidade de Oxford mostrou uma elevação de seis pontos porcentuais na confiança, na comparação entre o início da crise e junho do ano passado em termos globais. No que diz respeito ao Brasil, o relatório que acompanha a pesquisa afirma que “a incerteza trazida pela crise da saúde aparentemente fortaleceu o interesse das pessoas por informações confiáveis”. Enquanto o índice de confiança na mídia
no País é de 54% (um dos mais altos do mundo), o porcentual de confiança em notícias apresentadas nas redes sociais é de 34%. Quando se trata de buscar fontes fidedignas, a grande imprensa ainda é a principal referência, movimento que ganhou força com a pandemia.

Por fim, ainda quando se trata de grande imprensa, um exemplo positivo frequentemente citado é do New York Times, que vem registrando sucessivos resultados positivos. No ano passado, conquistou 375 mil novos assinantes e registrou um lucro operacional de US$ 268 milhões, alta de 52% na comparação com 2021. Seu modelo de negócios, hoje, baseia-se em boas histórias, newsletters bem produzidas e um equilíbrio entre conteúdo gratuito e pago, o primeiro levando ao segundo, proporcionando bons índices de conversão.

O Brasil deverá enfrentar este ano, uma das eleições mais polarizadas de sua história, um terreno fértil para a propagação de fake news — fenômeno, aliás, que vem se repetindo em eleições por todo o mundo.

Um cenário em que, mais do que nunca, teremos de contar com uma imprensa livre e independente. Que nos sirva de inspiração o centenário exemplo do pioneiro Hipólito da Costa e seu Correio Braziliense. Uma mídia criteriosa e isenta é um dos principais pilares da democracia.

Feliz Dia da Imprensa.

Danilo Vivan

Sócio-diretor da Fato Relevante

Danilo Vivan é jornalista formado pela Unesp, com graduação também em Direito e pós-graduação em Finanças (FIA-USP) e Relações Públicas (ECA-USP). Possui mais de 20 anos de experiência em Comunicação Corporativa. Na Fato Relevante, já atendeu contas como XP, C6 Bank e Brasil Mata Viva.