Foto do começo da FR em 2019. Hoje somamos 100 pessoas no time. 69 são mulheres, sendo 17 em cargos de liderança.

O BANQUINHO QUE VIROU UMA ARQUIBANCADA

Por Lia Carneiro, sócia-diretora da Fato Relevante

Publicado em 8 de março de 2022


Aproveito a data para trazer uma reflexão com um pouco da minha experiência profissional e os desafios de ser mulher, executiva, mãe, esposa, filha etc.

 Quando fizemos a primeira foto da FR, sentada no banco do piano da casa, cercada de homens em pé, lembrei de outras ocasiões em empresas diversas, que, por muitas vezes, era a única mulher. Do jatinho do staff do CEO às reuniões em unidades fabris das empresas em que o corpo gerencial sempre foi majoritariamente masculino.

Foi um flashback em rotação acelerada, ri um pouco sozinha ao pensar no padrão que se repetia. Nada contra trabalhar com homens, mas a cobrança é sempre maior. Duas características da liderança masculina, competitividade e dar a palavra final, costumam render bons embates. Na verdade, por mais inclusivos que sejam, há sempre pontos de atrito desafiadores. Isso faz parte da natureza humana, do fato de mulheres e homens pensarem diferente – só descobri isso depois dos 30 anos, foram muitas noites desperdiçadas tentando entender a cabeça deles.

 Mas voltando ao banquinho, ali, sorrindo, eu me senti poderosa. Um negócio próprio, empreender com apoio e suporte, com nome e sobrenome, e, principalmente, com pessoas que me respeitam e me valorizam. Mas, o mais importante aqui na FR, foi a oportunidade de construir uma empresa com a minha cara, que respeita pessoas, raças, gêneros, sexos, religiões e todas as minorias. E que não admite abusos, nem de gestor, nem de colega, e muito menos de cliente. Contamos com um Comitê de Ética e um canal de denúncias, construídos logo na largada, que garantem anonimato e correção de rota.

 Definitivamente, não temos uma jornada profissional simples. Os papeis assumidos nas 24 horas que dispomos, a arte de combinar todos esses personagens é, acredito eu, o nosso maior diferencial.

 O que não cabe mais é o mandamento sagrado de que nascemos para ser mulheres maravilha: cuidar de filhos, da casa, ser super executiva, entregar todas as metas e bater o maior bônus da empresa, estar sempre linda, magra, jovem e maravilhosa, e com tesão para encarar maridos, esposas e namorados(as). Isso não rola nem mais na novela. 

Há quem possa até tentar fazer tudo isso. Mas tudo bem se não fizer. Temos que ter liberdade de escolha de papéis e poder questioná-los.

Nem toda mãe tem que amar ser mãe, nem se apaixonar pelo filho ali na mesa de parto. Isso não é obrigação. Nem sempre a conexão é imediata. Às vezes, simplesmente não acontece. Vale o mesmo para a saia lápis. Às vezes, a pressão é insuportável, e a gente engole o burnout, a demissão por não ser high potential ou por ter passado dos 50. Temos que chutar tudo para o alto. E não estar sempre buscando uma coerência entre ser tudo, se superar, o que, definitivamente, além de não ser saudável, nem sempre existe, é uma ficção.

 Entendo que não cabe aqui contar as muitas dores, humilhações e assédio que sofri. Podemos conversar sobre o tema em outro momento, mas, hoje, é importante que o tom da prosa seja positivo e forte. Com a assinatura da persistência de guerreiras, essas sim todas, não interessa os pratinhos que escolheram, ou não, equilibrar.

Sim, coisa de mulher.

Lia Carneiro

Sócio-diretor da Fato Relevante

Lia Carneiro é Sócia-diretora da FR (a primeira), jornalista e especialista em Recursos Humanos, Comunicação Corporativa e Economia. Como empreendedora na Fato Relevante, atua em gerenciamento de crises e coordena contas em áreas diversas como indústrias e fintechs.