Agricultura sustentável faz bem para o Planeta e para o bolso

Por Bruno Blecher, sócio-diretor da Fato Relevante

Publicado em 28 de JULHO de 2022


Quem mora em Pinheiros, bairro boêmio da zona Oeste de São Paulo, é vizinho de uma fazenda que oferece diariamente alface, rúcula, espinafre, couve, entre outras verduras, fresquinhas e sem uma gota de agrotóxico.

Paulo Bressiani, 31 anos, não tem um palmo de terra, mas produz na Fazenda Cubo, a oito quilômetros da Praça da Sé, 850 quilos de hortaliças por mês em um sistema hidropônico. As plantas são empilhadas em estantes e alimentadas com adubo, água e luzes LED.

Engenheiro ambiental, Paulo nunca imaginou que se tornaria um agricultor. Ele começou a desenvolver o seu modelo de negócio em 2018 e abriu as portas de sua fazenda indoor um ano depois. A Cubo ocupa 90 metros quadrados e seu sistema de produção Paulo tem uma série de vantagens – desperdício de menos de 1%, quando a cadeia das folhosas costuma ter perdas de 50%; proximidade do consumidor e o fato de dispensar o uso de agroquímicos.

No universo dos 5 milhões de propriedades rurais do Brasil, o modelo da fazenda Cubo representa zero-vírgula-zero-zero-quase nada, mas escolhi Bressiani neste 28 de julho, o Dia do Agricultor, porque ele representa o futuro e indica uma tendência global.

As novas gerações de consumidores estão preocupadas com três dimensões – saúde, meio ambiente e bem-estar animal.

Em uma entrevista que fiz no ano passado para a Folha, o cientista Maurício Lopes, ex-presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), disse que o consumidor é o grande arquiteto das mudanças que estão em curso na agricultura e isso vai se intensificar.

Segundo Maurício Lopes, as fazendas do futuro, onde quer que elas estejam, em Mato Grosso ou em São Paulo, terão que buscar modelos de produção mais integrados e resilientes, combinando múltiplas lavouras, criações e florestas que viabilizem a produção certificável de carbono neutro de alimentos, fibras, energia, além de biomassa, que tende a se tornar componente para descarbonizar as indústrias química e de materiais.

Além de alimentos e energia, as fazendas devem produzir água, fixar carbono e cuidar da saúde do solo. É o que chamamos de agricultura regenerativa, que colhe mais alimentos em menos área, sequestra CO2, protege a biodiversidade e regenera terras vulneráveis ou degradadas.

Para atingir este nível de complexidade, o campo precisa estar cada vez mais inteligente, conectado e automatizado.

A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é uma estratégia regenerativa de produção que vem crescendo bastante no Brasil nos últimos anos. O ILPF já é realidade em 17,4 milhões de hectares da área de 208,6 milhões de hectares ocupados pela agricultura e pela pecuária no Brasil. Ou seja – 8,35%. De 2005 para cá, a área do ILP saltou 52%.

A tecnologia utiliza, dentro de uma mesma área, sistemas produtivos agrícolas, pecuários e florestais. Com isto, otimiza o uso da terra, eleva os patamares de produtividade, usa melhor os insumos, diversificando a produção. Dessa forma, gera mais renda e emprego e contribui para reduzir a emissão de gases causadores de efeito estufa.

A ILPF permite ao produtor colher quatro safras por ano na mesma área. Ele planta e colhe a soja, depois planta milho e capim, colhe o milho e deixa o capim para alimentar a boiada. Depois de sete anos, ele tem também a sombra e a renda da floresta.

Como o Brasil tem cerca de 130 milhões de pastos degradados, podemos rapidamente multiplicar as nossas safras sem ter que derrubar uma única árvore?

A restauração florestal, uma das exigências do Código Florestal, também é um bom negócio para os produtores rurais. Para cumprir um compromisso assumido em 2021 nas Nações Unidas, o Brasil tem que restaurar 12 milhões de hectares de terras degradadas até 2030.

Isto pode gerar até 2,5 milhões de empregos, segundo aponta um estudo publicado recentemente no “Journal People and Nature da British Ecological Society”.

O estudo, coordenado pelos pesquisadores Pedro Brancalion, professor da Universidade de São Paulo (ESALQ-USP), e Rafael Chaves, especialista em meio ambiente da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, mostra que a restauração florestal tem potencial de gerar 1 emprego a cada 2 hectares.

Segundo levantamento da ONU, a restauração de ecossistemas não é boa apenas para a saúde do Planeta, cada vez mais ameaçado pelos impactos do aquecimento global. Também é bom negócio. Além de milhões de empregos, a prática vai gerar cerca de 7 trilhões de dólares todos os anos, ajudando a eliminar a pobreza e a fome.

Bruno Blecher

Sócio-diretor da Fato Relevante

Blecher trabalhou nos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo. Foi diretor de Redação da revista Globo Rural e comentarista de agronegócio da rádio CBN.