Preços dos alimentos estão pela hora da morte

Por Bruno Blecher, sócio-diretor da Fato Relevante

Publicado em 22 de AGOSTO de 2022


O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, “inflação oficial” do País e que serve de base, por exemplo, para a determinação da taxa Selic) apontou uma deflação de 0,98% em julho, mas o item alimentos e bebidas segue em disparada.

Doze dos 13 itens da cesta básica tiveram alta nos últimos 12 meses (até julho).

É uma situação alarmante para um país que tem cerca de 30 milhões de pessoas em crise alimentar e taxa de desemprego ao redor de 9%.

A maior parte da população brasileira tem renda de até R$ 1,9 mil, e nessa faixa, segundo a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), o gasto com comida representa mais de um quinto da renda.

No acumulado de 12 meses medido pelo IPCA, a inflação do grupo alimentação e bebidas está próxima de 15%. As maiores altas são de mamão (99%), melancia (81,6%), cebola (75,15%), morango (73,86%), batata inglesa (66,62%) e leite e derivados (41%).

Por que os preços dos alimentos subiram tanto este ano?

A disparada dos preços de frutas e hortaliças quase sempre está ligada à sazonalidade ou ao clima. Os preços sobem na entressafra e caem na safra. Isso quando o clima é favorável.

No caso de soja, milho, café e carnes, produtos de exportação, os preços seguem as cotações internacionais (em dólar) e, claro, ficam ao sabor da oferta e da demanda.

Nos últimos anos, a forte alta da soja e das carnes foi consequência da elevação da demanda da China, o maior cliente do agro brasileiro.

A China foi responsável por US$ 4,64 bilhões dos US$ 7,47 bilhões que o Brasil faturou entre janeiro e julho com as vendas externas de carnes bovina, 50% a mais do que no mesmo período de 2021.

Na safra 2021/2022, a guerra Rússia Ucrânia também elevou os preços dos alimentos. Os dois países são grandes produtores de trigo e milho, além de fertilizante, insumo importado pelo Brasil.

A disparada do leite

O levantamento de julho do Procon-SP com o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), divulgado ontem (16 de agosto), sobre os custos da cesta básica, mostra que o preço do leite longa vida subiu 72% nos últimos 12 meses, saltando de R$ 3,95 para R$ 6,79.

No caso de leite e derivados, vários fatores contribuíram para a disparada dos preços.

O principal é a entressafra, época de pouca chuva e pastos ralos, o que reduz a alimentação e, consequentemente, a produção das vacas.

Os preços da ração (como o milho) e dos insumos também subiram, pressionando os custos de produção.

Os pecuaristas reduziram o investimento na atividade e muitos até deixaram de produzir leite.

Mas com o início da primavera, quando as chuvas voltarem, a situação deve melhorar e os preços do leite e dos queijos provavelmente vão cair.

Já os adeptos do churrasco de domingo devem se contentar com as asinhas de frango e as costelinhas suínas, porque o preço da picanha vai continuar pela hora da morte.

Por causa do apetite chinês e da queda da renda do brasileiro, o consumo per capita de carne bovina por aqui vem recuando nos últimos anos. Era de 30,6 kg por habitante em 2019, período pré-pandemia de Covid 19, e caiu a 24,8 kg neste ano, uma queda de 20% e o menor nível da série histórica, que começou em 1996.

Bruno Blecher

Sócio-diretor da Fato Relevante

Blecher trabalhou nos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo. Foi diretor de Redação da revista Globo Rural e comentarista de agronegócio da rádio CBN.